Friday, April 8, 2011

Semana from Hell - 6 posts em 1 - (alerta de texto gigante)

LOST IN TRANSLATION

Esta última semana foi a mais difícil que eu já tive aqui em NY.

Eu tenho buscado me manter forte, e mesmo quando eu choramingo aqui no blog geralmente minha postura nas aulas e no dia-a-dia é muito feliz.

Mas nesta semana tive este grande problema vindo à tona, que me deixou muito nervosa e desequilibrada.

Nada como dois bancos resolverem sumir com o dinheirinho que você precisa para sobreviver e um ficar jogando a culpa no outro por um bom tempo. E enquanto isso todas as contas estavam atrasadas. E durante uma emergência eu não tenho ninguém para correr. Meu telefone não faz ligação para o Brasil. O skype só funciona se a outra pessoa estiver online, o que nunca acontece quando eu mais preciso. E eu recebia as mensagens do Brasil no meu celular e eu não conseguia retornar.

A falta de comunicação quase me deixou maluca. Eu fui ao extremo do nervosismo, chorando na frente de qualquer pessoa. Todas as pessoas do prédio da Dança já devem ter me visto chorando e falando Português na frente de um computador.

E o sentimento de culpa então? Já me sinto responsável por dar o máximo de mim naturalmente. Mas sob a situação que estou eu me cobro 24 hs por dia. Pois eu tenho que valer o investimento insano que estão fazendo em mim. Ou morrer tentando.

...

TORTURA

E essa semana foi simplesmente tão difícil. Enquanto eu tentava resolver este problema que estava me consumindo, eu tenho um schedule normal para seguir. Eu não falto em aulas.
Nenhuma.

E então na segunda e na quarta foi o dia da apresentação da música para a aula de teatro. Não estava nem dando bola. Gosto de cantar. Não tenho uma grande voz, mas quando estou a vontade amo cantar, e geralmente as aulas de teatro me deixam a vontade.

Mas este não foi o caso.

Cantar ponta de areia, que é uma música que sei desde a minha infância e que me lembra tanto o Brasil não foi nada fácil. Só vivendo fora do país e passando por isso aqui pra entender o que eu tive que fazer:

Fui a primeira pessoa a ir cantar a música na quarta, já estando carregada dos problemas de fora da aula. Na segunda já havia ocorrido a primeira sessão de terrorismo, com pessoas indo cantar uma a uma, algumas chorando. E eu chorando junto com cada uma que cantava.

Imaginem uma sala de dança enorme, com todos seus colegas e a professora sentados encostados nua parede, e um banquinho no meio da sala.

Me levantei e fui sozinha encarar o resto da sala.

Respirei fundo. Uma, duas, três vezes. Abri a boca e cantei, minha voz saiu grave e nervosa.

Quando terminei a professora pediu para eu sentar no banquinho e aí o terrorismo começou.

Ela me perguntou o significado da música. Eu falei a tradução.

Eu escrevi aqui que esta música era a que tinha a menor capacidade de me fazer chorar. Não fala "eu", não fala "você". Só conta uma história triste.

Mas a professora me apertou até eu dizer na frente da sala o que a música significava para mim:

Representa a saudade. A ponte com o meu país e com a minha família que eu tive que quebrar. O medo de ser esquecida. De estar incomunicável. De ninguém me ouvir. E de estar completamente abandonada.

E projetar a voz na sua língua, no meio de um monte de gente que não entende a mínima do que você está falando, tem um poder emocional assustador. É como um grito de desespero no vazio, escuro e sem ar.

E neste estado, aos soluços e lágrimas, a professora me pediu para falar o texto, como se eu estivesse dizendo isto para minha família.

E por último ela pediu para eu levantar e cantar mais uma vez. E foi aí que eu despedacei. Cantar depois de ter ficado completamente nua, na maior zona de desconforto e vergonha que já passei na minha vida?

Tentei recomeçar a cantar. E eu olhava em desespero para todos a minha frente, querendo que a tortura acabasse logo.

Minha professora com uma voz amiga me dizia para eu tomar quanto tempo fosse.

Eu nunca desisto. Mas no meio da música tive um acesso de choro, a voz não saia da garganta, eu sentia meu corpo se dobrar ao meio e eu achei que eu ia cair ou desmaiar de exaustão ali mesmo.

E falei: No. I can't do this. Entre lágrimas e em total desespero.

E então a professora me disse que eu tenho que controlar as emoções e direcioná-las. E me perguntou: Quem dirige o carro? Você ou o carro?

Do meio do choro, brotou um sorriso. E falei para ela que eu sempre dizia estas frases para as minhas alunas, e é uma das frases que eu mais gosto.

Respirei mais uma vez, e cantei até o fim.

Depois fui conversar com a professora, e ela falou que agora qualquer coisa vai ser bem mais fácil na minha vida. Quando a gente supera uma situação de pressão extrema como essa e ganha, a segunda vez fica mais fácil.

Não foi a toa que numa das primeiras semanas de aula aqui em NY, lá atrás em Setembro, uma professora soltou a pérola de que a o nosso curso é na verdade bem pior do que a vida lá fora. Se a gente sobrevive aqui, a gente aguenta qualquer coisa.

....

COTTAGE CHEESE

E a minha alimentação indo para as cucuias? Eu preciso urgente emagrecer, mas quem disse que eu paro de comer coisas estranhas neste país. E agora que eu aprendi a comer o macarroni and cheese, biscoitos milano, pizza do st marks a 1 dólar, cafés no lugar da janta, etc. eu to frita. Ainda não americanizei completamente. O duro vai ser quando eu sucumbir ao pote de hagen Daaz à 3 dólares e comer na colher.

Pelo menos fui assistir dois concertos no Carnegie Hall, esta semana. Fiquei maravilhada com aquele teatro.

Mas para completar minha maré de desastres da semana eu estava correndo para ir a um destes concertos quando abri a mini geladeira do meu quarto, e o meu pote de Cottage Cheese se suicidou. Ele pulou direto da porta da geladeira encarando o chão duro e frio. Não tive tempo para reagir.

Não deu pra salvar quase nada. Poxa, a situação já está tão difícil, a última coisa que eu precisava era perder a comida da semana. Mas enfim, como eu estava feliz indo para o Carnegie Hall não deu para ficar muito deprimida.

....

CARNES NO MERCADO

Sexta-feira.
Mais uma audição.
Desta vez a coreógrafa foi a Kate Weare.
De todos que pesquisei esta foi a que menos me atraiu, porque o trabalho me soou hermético demais.
Mas mesmo assim queria fazer uma boa audição. Só que depois da semana traste que tive seria uma ilusão fazer um trabalho excelente na audição.

Mas enfim, ela chegou e sentou com a pranchetinha com os nossos nomes do lado do professor chefe de departamento, e o assistente dela começou a passar uma sequência. A sequência era super interessante, cheia de saltos malucos, braços jogados, etc. E o assistente dela ficou fascinado que nós não tínhamos números, e sim que todo mundo era chamado pelos nomes.

E então naquele mesmo esquema, dividindo a gente de 5 em 5 pessoas, fomos apresentando.

Em seguida a própria coreógrafa passou uma outra frase curta com movimentos gestuais e então nós fomos divididos em duplas e tínhamos que criar algo com o material que ela tinha passado. Foi tranquilo e bacana de se ver. E por último ela pediu que juntássemos a primeira sequência e emendássemos com a frase que havíamos criado.

Minha cabeça zunia durante toda audição, mas consegui me manter focada e fazendo o máximo que pude.

Estava tudo bem até aí.

Então a Kate resolveu falar algumas palavras... Disse que audição é sempre complicado, que ela ficou feliz por termos divididos nossas visões artísticas com ela. Mas para ninguém ficar chateado, porque a seleção se dá com base no que mais se adequa ao estilo dela apesar de todos sermos talentosos. (Blá blá blá) E ela falou em tom de conselho para nós sempre termos esta visão em audições.

Ok.

E então ela começou a chamar alguns nomes e pediu para estas pessoas fazerem uma fila na frente dela. E então ela chamou mais alguns nomes e pediu para eles se alinharem a frente da fila anterior. Aí ela anunciou feliz da vida: "primeira fila - vocês são meu elenco. Segunda fila - eu não tenho certeza, gostaria que vocês dançassem de novo."

Todo mundo se olhou com cara de: que situação desconfortável.

Um discurso novo e bonito, pautado pelas mesmas velhas ações.
É balé, é contemporâneo, é circo de Soleil, é companhia da esquina.
O mesmo tipo de tratamento:

Coloque as pessoas numa fila e as selecione como se elas fossem uma variedade de carnes a serem escolhidas no mercado. E deixe as carnes estragadas de qualquer jeito ao lado.

Sinceramente, não ligo de saber que eu não vou fazer parte do elenco dela. Mas o que me irritou muito foi o tratamento dúbio. Falar uma coisa bonita e ter uma ação completamente sem tato. Se eu que já sou mais velha e não queria dançar para ela, já me senti mal. Imagina todas as menininhas de 19, 20 anos que colocavam suas esperanças nesta coreógrafa.

Bom. Mas para eu que achava que minha vida na NYU fosse ser assim sempre, esta foi a primeira vez que teve uma audição deste jeito.

E é ótimo. Porque é quando nós temos as piores experiências é que nós criamos paralelos com o que queremos ou não nos tornar.

Eu vou ter minha companhia. Cada vez mais tenho certeza disso. E então eu sei que tipo de pessoa eu quero ser ao fazer uma audição, ao lidar com outras vidas. Porque eu estou falando de dança, mas na verdade verdadeira eu acabo mesmo é falando de vida e de relação humana. No fundo o que importa, e que faz a diferença é a maneira como as pessoas interagem. E se elas se respeitam, e buscam um mundo melhor, elas devem agir com uma conduta correta que levará de alguma forma à felicidade.

(Vixe... fui longe agora, não?)


.....

RIO DE LÁGRIMAS

E eu passei a minha semana me debulhando em lágrimas, em desespero.
Realmente nunca tinha ficado neste estado. Só hoje umas cinco pessoas perguntaram se eu estava doente, passando bem, etc. Isso porque o drama pior foi quarta e quinta.

E agora... como a minha dor parece insignificante frente a outras coisas tão piores.

Quanta tristeza no rio.
Não deve haver nada mais triste do que ver partir alguém que você esperava ver a vida inteira se desenrolando.
Crianças.
Mas eu tenho que acreditar que este mundo vai melhorar.
Não é possível.
Tudo tem uma explicação.

.....

LIVROS DE CABECEIRA

Geralmente tento me manter bem imparcial no meu blog, não declarando publicamente algumas coisas pessoais.
Mas tenho dois ou três livros de cabeceira, que me ajudam a refletir e a colocar a cabeça no lugar quando estou cheia de dúvidas.

E hoje foi isso que um deles me disse:

" o fardo é proporcional às forças, como a recompensa será proporcional à resignação e à coragem; (...) mas essa recompensa é preciso merecê-la, e é por isso que a vida esta cheia de tribulações."

E o outro me deu um pito:

"A revolta constante gera desequilíbrios na mente, no corpo e na alma.
Tem calma sempre.
O que agora não se resolva, está a caminho da solução."

Uma hora depois da minha leitura e estando eu bem mais calma, recebi ligações dos bancos que fizeram da minha vida um caos nos últimos 10 dias, me dizendo que todos os problemas foram resolvidos.

5 comments:

  1. Nossa, tem 6 post nesse post, não sei nem como comentar...

    Mas eu chorei lendo o do "Ponta de Areia"...

    E gostei mto mto mto do último. Ah, esses livrinhos de cabeceira.

    Vamos nós, vivendo e aprendendo!

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  2. Eu sei que eu devia ter separado o post, mas como tudo estava meio interligado eu decidi escrever deste jeito ué!!!
    E sabe qual é o próximo assignment da aula de teatro?
    Cantar a música de novo só que desta vez, temos que cantar como se fossemos uma pessoa famosa cheia de maneirismo... tipo: pensa no michael jackson cantando ponta de areia... é por aí.
    To frita. Eu não sei imitar ninguém..

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  3. minha querida!!!!!!!
    esse post me fez ficar muito emocionada por me fazer lembrar de mim mesma nos tempos da graduação... lágrimas fazem parte mesmo..... pouca grana tbm, infelizmente.... ainda bem que eu tinha vc pra me dar caronas!!!
    te amooo

    bjokasss

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  4. Eu li tudo!

    Gostei muito do "ponta de areia" tbm, e apesar dos seus choros e soluços gostei muito de vc ter conseguido superar e cantar...tem dias na nossa vida q conseguem ser tão desesperadores que parecem que a gnt não vai conseguir sobreviver...

    o melhor de tudo isso é que quando tudo passar vc vai poder olhar pra trás e se orgulhar de td oq fez!

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  5. No meio de todas essas lágrimas, pelo menos dei boas gargalhadas com o "suicídio" do seu cottage cheese em direção ao chão duro e frio.

    Mas pode parar de ficar comendo macarroni and cheese e pizza de 1 dólar, hein! Bailarina não consegue parar em pé com uma alimentação ruim dessas...

    Gostei muito da parte quando você fala:
    "Porque eu estou falando de dança, mas na verdade verdadeira eu acabo mesmo é falando de vida e de relação humana."

    Certamente, concordo com você que, em arte, deveríamos sempre ser sensíveis, tratar as outras pessoas com respeito e tentar ser feliz (e não ser um mártir).

    Bjs

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